A realidade é
sempre muito mais complexa, que as imagens que nos fazem criticar apenas o mau
funcionamento da estrutura pública.
O estado crítico
em que se encontra a sociedade brasileira é fruto de um conjunto de desmandos
que foram se enraizando através de décadas e décadas de desserviço público,
especialmente na área da educação e, depois, na permissividade que passou
propositadamente a fazer parte do quadro da politicagem instituída.
Durante duas
décadas investi tempo (quase todo) e dinheiro na estruturação, na manutenção e
na atualização de conteúdo de alguns sítios na internet, com a finalidade de
chamar a atenção do conjunto social para o que vinha ocorrendo, mas os frutos
desse plantio não encontraram mercado consumidor, pois a verdade parece não
interessar à maioria, especialmente em razão da deseducação implantada com
eficácia e do individualismo que também parece crescer de forma desordenada.
Houve uma mutação
de valores dentro de um processo muito rápido, “bem” estruturado e que levou a
maioria da sociedade a valorizar abertamente o “ter” em total detrimento do “Ser”.
Deixamos a
percepção da realidade imutável da vida – o espaço entre o encarne e o
desencarne – para irracionalmente passarmos a acumular bens materiais que serão
deixados para trás no momento do retorno inevitável. Esse acúmulo, que foge à
racionalidade, seria menos pernicioso se, ao promovermos tal processo, não
estivéssemos deixando a descoberto as muitas carências que afligem o nosso
semelhante e são caminho certo para o desequilíbrio social e para a insegurança
que finalmente tira o nosso sono e a nossa paz interior.
Feitos esses
prolegômenos, gostaríamos que o leitor nos acompanhasse durante a explanação do
objetivo original, que é a análise de muitos dos pequenos problemas que se
acumulam no dia-a-dia, por conta da inação do poder público e da ação predatória
levada a efeito pela maioria do conjunto.
Fazendo parte de
um grupo (organização independente) que tenta mostrar as falhas estruturais na
sociedade local, tenho sido estimulado a continuar evidenciando os pontos onde
são urgentes as correções, pois elas nos parecem mais fáceis do que realmente
são e, para exemplificar citarei alguns exemplos observados no dia de ontem.
Apenas no dia de ontem, em duas saídas de casa.
Depois de acionada
a Ouvidoria Municipal, na tentativa de solução do problema de “impedimento ao
trânsito de pedestres” em muitas das calçadas da cidade, percebe-se que a
questão vai muito mais além, tanto na competência – que também é do Estado –
quanto na responsabilidade pela ocorrência, pois envolve os comerciantes - que
lucram com o abuso e com seu silêncio cômodo – e especialmente os usuários
desses locais, pois demonstram não terem qualquer noção de respeito ao
semelhante e muito menos ao que é de uso público (alguns “orientadores”
educacionais colaboram).
Com esse assunto
ainda fervilhando no cérebro, fui até a feira da Rua Cunha Moreira. Na volta,
ao iniciar a travessia da Avenida Senador Feijó (com o bonequinho extraterreno
em evidência), um táxi cruzou a faixa de pedestres, fazendo de conta que o
pequeno marciano não existia. Anotei a placa e prossegui. Na Avenida Washington
Luiz fiquei aguardando uma chance de atravessar na faixa de pedestres, mas o
fluxo era contínuo e a tal “Faixa Viva” é a hora da morte. Por fim o fluxo
parou, por impossibilidade de prosseguirem, mas a faixa ficou impedida por um
automóvel atravessado sobre ela. Decido esquecer o motorista da infração
anterior, pois não se tem lógica ficar tentando fazer chover no molhado.
Depois do almoço
assisto a uma excelente palestra sobre os temas importantes da vida e que
culmina com exemplos sobre a prática do perdão.
Acompanho uma
das participantes até uma agência bancária próxima, pois ela tem alguma dificuldade
de locomoção. Seguimos pela Avenida Conselheiro Nébias e, ao chegarmos no
cruzamento com a Avenida Francisco Glicério, notamos que um idoso, conduzindo
um triciclo motorizado, iniciou a travessia quando o “marciano” estava ausente.
São apenas exemplos; poucos dentre inúmeros e cada vez mais constantes.
Logo depois, já
do outro lado da avenida transversal, aguardávamos sinal verde para a travessia
da Avenida Conselheiro Nébias, em direção da agência bancária que fica ao lado
de uma farmácia de esquina.
Dentro da programação
que privilegia as máquinas, em detrimento dos pedestres, o sinal fechou para os
veículos que transitam pela avenida principal, mas abriu imediatamente para os
que vêm pela transversal e também fazem conversão à direita em direção da
praia.
Quando o sinal
verde se abre para a travessia do pedestre, ele chega ao canteiro central e
apenas inicia a travessia da outra faixa, quando o semáforo é aberto novamente
para o trânsito de veículos e o casal de pedestres (ambos já passados dos
setenta) fica tolhido entre duas faixas de veículos em movimento. Sensível ao
problema, um motociclista parou o seu veículo e com ele todos os que o seguiam,
permitindo que o casal de idosos pudesse concluir a travessia.
Conclui-se:
Será que vale a
pena tentar mostrar o que é tão evidente?
Carlos Gama.
12/12/2019
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